sexta-feira, 4 de dezembro de 2015

CIRCUITO DA SAUDADE (Publicado no Jornal "O NORTE FLUMINENSE" - 27 de novembro de 2015)

CIRCUITO DA SAUDADE
                                                                                           Vera Maria Viana Borges
        
                                 Passando rapidinho pelo Facebook, surpreendi-me com um vídeo intitulado “Saindo e entrando na Vargem Alegre (Pirapetinga, 5º Distrito de Bom Jesus do Itabapoana) e a seguir um outro “FAZENDA DAS AREIAS”. A postagem era do Dr. Eduardo Ribeiro Gomes, exímio pianista e médico brilhante na cidade do Rio de Janeiro, filho de Vera Ribeiro e Romeu Gomes, consequentemente neto de Chichico das Areias. Vera Ribeiro era mais conhecida como a Vera do INSS. Mulher elegante, alegre e guerreira, brava e forte ante as vicissitudes da vida. Um enorme Ser humano, de nobre e elevado coração, defensora ferrenha dos pobres e oprimidos.
                            Resolvi pegar uma carona virtual e fiz o percurso de Bom Jesus a Pirapetinga junto com os protagonistas daquele circuito da saudade. Enquanto assistia aos agradáveis, sensíveis e primorosos vídeos que exaltavam a beleza do campo e da natureza daqueles lugares em que viveram, senti as ações e reações do Dr. Eduardo e de sua irmã Tê, Maria Tereza Ribeiro Gomes. Quanta saudade, quantas coisas maravilhosas ali vividas e agora sepultadas pelo tempo, mas muito VIVAS em suas almas e em seus corações. Na primeira parada, admiravam a casa de Iracema e Agostinho Boechat, quando Maria Lúcia Seródio Boechat , nossa dileta amiga Lucinha, chegou e os recebeu com gentilezas e lhes apresentou o Museu da Imagem mantido pelo Instituto Iracema Seródio Boechat. Cordialmente ela sempre se coloca à disposição de todos os visitantes que lá comparecem e os leva a conhecer o extraordinário acervo que conta com RELÍQUIAS, entre as quais objetos da época dos escravos. Ali está registrada a HISTÓRIA de todo aquele amado e belo torrão. Dr. Eduardo e Tê suspiravam a cada foto, a cada objeto e a cada documento, fazendo comentários saudosos e amáveis sobre aqueles com quem ali conviveram. A sensibilidade aflorava às vezes em sorrisos, outras vezes em lágrimas. Virtualmente revisitei o  MUSEU em Pirapetinga. Após, partiram para a Fazenda das Areias. Acompanhei-os naquelas andanças. Emocionei-me com eles e muitas vezes do riso se fazia o pranto. Foi muito bom aquele mergulho no TEMPO. Foi espetacular!!! Um documentário histórico-cultural pontuado de reminiscências de uma época ditosa e saudosa... Retalhos de uma infância saudável e feliz. Contente estou por adentrar nesta viagem mágica, cheia de encantamento. Senti a emoção dos dois ao se depararem com as RUÍNAS da Fazenda na qual viveram a quadra mais feliz da vida e que está perpetuada no recôndito mais fiel de suas memórias. No percurso de vales e montes, desabafos e doces lembranças da lua linda prateada, dos pássaros, da bucólica paisagem e das recordações dos mais íntimos sentimentos. Adorei todo o percurso e percebi naqueles irmãos muita grandeza de espírito e nobreza de sentimentos. Bem se diz que, “quem sai aos seus não degenera”. “A formosura da alma campeia e denuncia-se na inteligência, na honestidade, no reto procedimento, na liberalidade e na boa educação.” (Miguel de Cervantes)   Momentos emocionantes e belos pontuados de angústia e saudade. A vida é mesmo assim. No dizer de Guimarães Rosa, “Viver é um rasgar-se e remendar-se”.
                                 Bendigo aos que preservam a memória. Retratá-la é valorizar o passado e seus legados e quem a renega pode-se dizer que não tem história. Retive as imagens e todo o encantamento daquela viagem no tempo.  Remotos sons, vozes e aromas se fizeram presentes. Parei novamente no Solar dos Boechat. Com o fluir dos anos vamos conquistando experiências e com os sentidos vamos captando impressões da vida buliçosa e irrequieta. Há lugares e pessoas que são fontes inesgotáveis de reminiscências que jamais saem do nosso imaginário. Como perder da lembrança os momentos vividos com  Iracema Seródio Boechat? Grande Mestra, Poetisa das mais admiráveis, credora da eterna gratidão e amor de quantos se privaram de sua amizade e de seu convívio.  De têmpera rija, defensora do progresso moral e intelectual de sua terra. Conheci a nobre dama na residência de sua prima, Professora Alzira Seródio Amim , mãe de Sucena, minha amada colega de turma.  Cursamos juntas o Ginasial e o Normal. Formamo-nos em 1961 e em abril de 1962 ingressamos no Magistério. Àquela época havia uma folga em data específica para o pagamento do professorado, assim Iracema e Isa Boechat vinham a Bom Jesus para receber. Era religioso o nosso encontro e minha admiração por ela era crescente. Fizemos o primeiro Vestibular da FAFITA e tive a grande honra de ingressar no Curso de Letras com ela e sua dileta filha Lucinha. Nossos laços se estreitavam. Tive alegria de compor o Hino da Escola Municipal  que ostenta orgulhosa o seu grandioso nome. Musiquei a letra, do HINO DE PIRAPETINGA,  feita por ela. Fiz-lhe o NECROLÓGIO na Academia Bonjesuense de Letras. Em ASTROS & ESTROS, publiquei em julho de 1996, a matéria intitulada - ESSAS ADMIRÁVEIS AVÓS!  AVE, CEMA!,  que está disponibilizada no site www.veraviana.com.br e que segue na íntegra, apenas em outro formato:  “...Filha, serás mamãe... por teu amor profundo/ /Jamais abrigarás desilusões... feridas.../ Porque já és divina em dar um filho ao mundo...”/ (Iracema Seródio Boechat) Iracema, mulher guerreira, que empunhando a bandeira de um grande ideal se transforma em nume tutelar no “berço de seu sonhar ”, a feliz e doce Pirapetinga. Seu trabalho reflete toda a beleza que exemplifica a arte. Sua poesia penetra, encanta com o perfume que exala de sua alma carismática. De aprimorada sensibilidade revela-nos a meiga, sensível e requintada poetisa. “Um dia ausentar-me-ei, terra querida e boa,/ Mas levarei comigo a glória de ser filho/ De solo idolatrado - a mãe que ama e perdoa.” E... ela se ausentou... O 21 de agosto de 1992 toldou-nos de tristeza e dor. Com a alma pungida curvamo-nos  reverentes à grande dama. “Abençoa Senhor, nossos netos que amamos: O Guto, o Frederico e a viva Mariana, E aqueles que de Deus nós ainda esperamos.” Deus ainda lhe proporcionou- Miguel Henrique, Agostinho Neto, Lara, Betina e Felipe.  Imortal é verdadeiramente a alma. Mas nessa descendência teve também a sua imortalidade. Nos grandes feitos de sua vida ela ficou perpetuada, e, imortalizada pelo seu talento, pois o poeta e a poesia não morrem... Publicou “Paisagens e Perfis” onde exaltou a terra, os pais, o esposo amado, os filhos, os NETOS, os irmãos, os amigos, as flores e a natureza. Esta mulher deixou inscrita de forma inapagável a marca insólita da esposa, mãe, AVÓ, mestra e literata. O Soneto Roda D’Água inicia seu livro, evidenciando assim o espírito de progresso e desenvolvimento da vila, a qual a “Roda D’Água” ajudou a crescer. “RODA D’ÁGUA:  Barulho de comportas, marulhante,/ Pingos d’água orvalhando a ramaria,/ É tua faina, diária, ofegante,/ Na jornada sem par de cada dia.// E a água cai sonora, deslumbrante,/ Em meio às flores em policromia./ Como és feliz, assim, cantarolante!/ Na jornada sem par de cada dia.// E se despede o dia. E a noite chega/ E do meu leito embalo a nostalgia./ Cessa a jornada igual de cada dia.// Cessa a jornada. É mudo o fim do dia./ E assim ficamos quietas de repente:/ Só as lágrimas caem do olhar da gente.”

Um comentário:

  1. Por um lapso, minha cara professora, deixei de incluir no seu currículo, de que me vali para fazer a sua apresentação aos ouvintes da Rádio Bom Jesus, naquela ocasião em que nos encontramos por lá, um título que lhe cabe, por mérito e experiência: o de memorialista.

    Um estilo no qual, aliás, a senhora se mostra exímia, neste belo texto, aqui publicado e que acabo de ler. Meus mais efusivos parabéns!

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