sábado, 30 de agosto de 2014

LITERATURA & CINEMA (Publicado no Jornal "O NORTE FLUMINENSE" - 26 de agosto de 2014)

LITERATURA & CINEMA
                                                                                              Vera Maria Viana Borges
          Sento para escrever. Chove lá fora, aquela chuvinha fina, com aquele friozinho doído, que nos convida a uma boa xícara de chocolate quente com biscoito frito passado no açúcar com canela. Melhor pegar um edredom e um bom livro, ou quem sabe um filme, já que a modernidade nos permite assistir a quaisquer filmes quando bem entendemos.  Estes dias cinzentos nos fazem recordar cada coisa, lembrei-me dos ditados de meus pais: “Primeiro a obrigação, depois a devoção”. Assim sendo, primeiro devo escrever e depois pensarei em LER ou assistir ao FILME. Associei o livro com a película e daí o título: Literatura & Cinema. 
        A Literatura e o Cinema são caracterizados pela Palavra e pela Imagem. A Literatura é a arte de compor ou escrever trabalhos artísticos em prosa ou verso e seu instrumento principal é a palavra. Já o cinema é a arte de compor e realizar filmes cinematográficos através da imagem. Duas artes com linguagens distintas que usam códigos diferentes. Ambas nos enlevam e nos encantam. É imensurável o prazer que nos proporcionam. Levam-nos a viagens mágicas que contribuem para o nosso crescimento intelectual e social. Apresentam-nos uma visão geral do mundo, viajamos sem nos locomover e sem correr riscos.
          Cinema é arte, cinema é cultura. As artes se distinguem pela sua linguagem. Quando uma câmera se aproxima, destacando um objeto ou uma cena, o que se projetou adquire maior importância dentro da história. A isto chamamos linguagem. Cada espectador fará uma interpretação e nisso está a riqueza de uma obra de arte. Cineasta e espectador estão ligados pela mesma cultura, assim como o escritor e o leitor. Muitas produções são baseadas em célebres livros. Tendo sido lido o livro, quando assistir ao filme poder-se-á comparar os dois, livro e filme, uma vez que cinema e literatura são linguagens que podem se enriquecer mutuamente. Cinema é linguagem vista e ouvida no tempo em que acontece. Só que o cinema não desfruta as metáforas e as construções literárias  usadas pela literatura. O cinema é uma mera narrativa enquanto a literatura tem a capacidade de sugestionar e emocionar mediante determinados processos e efeitos de estilo.
           A arte literária é anterior ao cinema, naturalmente constitui-se como referência. Claro que são convergentes, dirigem-se ao mesmo ponto. Não se pode negar a influência da literatura sobre o cinema, pode-se comprovar com prontidão nas ricas produções das adaptações em filmes e minisséries, ostentados por cores exuberantes, em cenas magníficas de beleza imensa. A linguagem literária é mais profunda e ampla. Sua transcendência a renova a cada leitura, a cada imagem sugerida. Nela formamos as imagens de acordo com a nossa imaginação. E, como a minha imaginação é fértil! Com ela construo pomposos e belos cenários. Já o cinema mostra ao espectador a imagem pronta. Em pequenos cortes, em fração de segundos descrevem um personagem, seu comportamento, seus hábitos e intenções. É tudo muito mais rápido. Eu, particularmente lendo, às vezes floreio e formo cenários mais encantadores, mais intensos e mais belos, ou mesmo, mais grotescos e mais rudes. Imagino cenas exuberantes, com mais cores e mais luzes. Muitas vezes o filme limita a imaginação do leitor. Apesar de tudo isto, são admiráveis os filmes adaptados de romances como “O CONDE DE MONTE CRISTO” de Alexandre Dumas, “MORRO DOS VENTOS UIVANTES” de Emily Brontë, “MADAME BOVARY” de Gustave Flaubert, “MOBY DICK” de Herman Melville, “ROBINSON CRUSOÉ” de Daniel Defoe, “A DAMA DAS CAMÉLIAS” de Alexandre Dumas Filho, “ULISSES” de Homero, “O VELHO E O MAR” de Hemingway, “GUERRA E PAZ” de Tolstoi dentre muitos  e muitos outros.
          Na década de 50 o Cine Monte Líbano era um esplendor aos nossos olhos. A atriz Romy Schneider estrelou três belíssimos filmes sobre uma das mulheres mais fascinantes da Europa no século XIX. Na trilogia do Diretor Ernest Marischka, Sissi é uma moça encantadora, adorável e cheia de alegria de viver que se casa com o apaixonado Imperador Frans Joseph I. Passam por transtornos e adversidades mas acabam felizes para sempre. Os três filmes que me encantaram narravam a vida de Isabel da Áustria que sofria de depressão devida ao casamento infeliz, à vida rígida na Corte Austríaca e ao mau relacionamento com a sogra. O marido estava sempre ocupado com a política do império o que contribuiu para a sua solidão. Em seu diário ela revelava: “Perambulo solitária sobre a terra há tempo, alienada da vida e do prazer, não tenho e nunca tive alma que me entendesse.” Em 1860 deixou Viena para uma viagem de dois anos pela Europa. Dos quatro filhos somente com a caçula Marie Valerie teve uma relação mais estreita. Sophie, a mais velha foi tomada pela sogra e morreu aos dois anos de idade. O único filho, Rudolf, educado longe de sua influência, aos trinta e dois anos se suicidou. Nas telas, bela história de amor, em rica produção. Na vida real, uma Imperatriz infeliz no casamento, vaidosa, egocêntrica e narcisista, depressiva e anoréxica. A Sissi da realidade tinha pouco a ver com a Sissi do Cinema.
     A Imperatriz da Áustria se engajou em causas humanitárias e chegou a visitar hospitais e asilos durante uma epidemia de cólera. Ela foi para o século XIX o que seria a princesa Diana cem anos depois. Muito lindas, cobiçadas e invejadas, imitadas, copiadas e envolvidas em uma aura de simpatia e bondade e ao mesmo tempo extremamente infelizes. Ambas morreram de forma trágica.
        Há casos em que as produções cinematográficas deixam a desejar em relação à obra ou à sua história. Não é possível condensar tudo em apenas algumas horas, mas elas poderão ser um incentivo, aguçando o desejo de se conhecer maiores detalhes da narrativa. Assim será favorecido o caminho inverso, será do cinema a influência para a literatura. 

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