domingo, 10 de julho de 2016

E ELA SE FOI (Publicado no Jornal "O NORTE FLUMINENSE" - 30 de junho de 2016)

E ELA SE FOI
                                                                                         Vera Maria Viana Borges
“Não temos aqui morada permanente, mas andamos procurando a do futuro.” (Hebreus 13:14)  Buscamos o que há de vir. Há um Provérbio Aborígine que diz: “Somos todos visitantes deste tempo, deste lugar. Estamos só de passagem. O nosso objetivo é observar, crescer, amar. E depois vamos para casa”. Nas memoráveis palavras da ÚLTIMA CEIA, Jesus nos assegura: “Vou adiante para vos preparar um lugar”. Esta certeza nos conforta, mas apesar da nossa Fé, não estamos preparados para a separação de nossos entes queridos. É uma dor cruel, pungente e lancinante. Dói demais. É de cortar o coração.
Embora difícil de aceitar, é o que existe de mais certo. Quando o indivíduo nasce, ele já entra na grande fila com destino à Pátria Celeste. Somos migrantes, caminhamos ao encontro do PAI, somos Cidadãos do Céu e estamos aqui apenas de passagem. Nossa vida e nossos corpos são provisórios e em tempo certo deixarão para trás esta vida em busca da Morada Eterna. 
Estava apenas com um ano e três meses, quando Deus me presenteou com uma bonequinha de carne e osso, que sorria, chorava e recebeu o nome de Sílvia Márcia. Não demorou, interagia com todos. Bricávamos muito e nunca brigamos. Numa noite, ainda éramos muito pequeninas, após o jantar ela foi pular corda e sentiu-se mal e enquanto era socorrida por mamãe e alguns vizinhos,  eu sofri muito, tive medo que lhe acontecesse o pior. Senti uma sensação terrível, de perda. Nunca esqueci aquele episódio. Vivemos por toda vida, muitíssimo bem. Com o falecimento de nossa amada mãe, além de irmã ela se transformou para mim num misto de mãe e filha. E agora, tantos anos após ela se foi, deixando imenso vazio em nossas almas e em nossos corações. E naquele vinte e nove de abril,  a natureza chorou conosco, chovia e fazia frio.
Quando vamos colher um fruto numa árvore, sempre escolhemos o mais bonito, ou o mais maduro. Assim Deus faz conosco, quando estamos prontos Ele nos colhe e nos acolhe em seu REINO. Acompanhei de perto o sofrimento e o seu derradeiro momento. Aos pés da cama eu recitava em voz alta o rosário percebendo que sua respiração diminuia lentamente. A enfermeira fechou-lhe os olhos e eu terminei a oração, envolvida certamente pela Misericórdia Divina. Alma e coração despedaçados. Desolada, fiquei como se em pleno voo me arrancassem uma das asas. Momento terrível e atroz. 
                            Ela cumpriu a sua missão. Casada com José Roberto da Silva Nery, teve duas filhas. A primogênita, Roberta, deu-lhe dois netinhos, João Pedro e Maria Clara. Da mais nova, Clarissa, ela não chegou a conhecer o netinho Bento que nasceu vinte e cinco dias após o seu falecimento. 
Professora dedicada, artista plástica e artesã. Tinha mãos de fada, tudo o que tocava se transformava e encantava. Mulher de princípios, esposa admirável, mãe sensível e avó solícita. Prudente, sábia, humana e muito modesta. Foi esposa, mãe, irmã, cunhada, tia, amiga, vizinha, madrinha, patroa, quase angelical. Na brandura do seu olhar e na ternura do seu sorriso estava a imagem de sua alma generosa e boa. Uma guerreira! Com coragem e dignidade enfrentou os mais dolorosos tratamentos. Sua FÉ era inabalável, viva e grandiosa. Temente a Deus, fervorosa, fiel devota e caridosa. No jardim de sua residência, a Virgem de Fátima em mármore sobre uma arvorezinha  era coroada constantemente em Celebração com os seus amados vizinhos e familiares. Recitava de cor várias passagens da Bíblia. Nas Campanhas da Fraternidade e nos Novenários do Natal era assídua e os encerramentos sempre realizados em sua casa, quando confraternizava com vizinhos e amigos. Foi exemplo, o protótipo do bem e do bom. Deixou-nos um legado de incomensurável importância.
Havia tão grande sintonia em nossas almas e em nossos corações que parecíamos gêmeas e devido a tal sentimento escrevi-lhe um acróstico intitulado “Almas Gêmeas” : “Se sente algo, também sinto,/ Invade-me a alma o sentimento,/ Livre de preconceito, não minto./ Você sorri, desmancho em riso./ Instante após, se chora,/Aperta-me o peito, sinceramente.// Mana adorada, parte de minha vida,/ Amável, sincera em todos os momentos,/ Rainha, mãe, meiga, perdoa-me sempre as falhas,/ Carinhosa, perfeita, terna, querida./ Instala-me a certeza de que somos/ Almas gêmeas, dos mesmos pais, de barrigada diferente.” Dediquei-lhe também um Soneto intitulado “SÍLVIA MÁRCIA”: “Da selva tem a brisa aconchegante,/ Amiga, amável, doce conselheira,/  De Deus trazendo o traço edificante/ Projeta muito amor com sua maneira.// Guerreira, marcial, forte e constante,/ Uma FADA que guarda a prole inteira,/ Na promoção do bem ao semelhante/ É luz, raio de sol, é companheira.// Presença que nos traz o céu ao chão,/ Cumprindo sabiamente o seu mister,/ Uma SANTA prostrada em oração.// Doçura angelical, foi sempre assim,/ Divina criatura, flor mulher/ Com ombros de almofada de cetim.” 
Alguns dias depois fui ao Cemitério, enquanto lá rezava o terço olhava somente para o túmulo, lúgrube e triste. Suspirando olhei para o alto. Baixando o olhar senti, ela não está aqui é lá em cima que ela se encontra. Parei de focar na sepultura e olhei para o céu que estava muito azul, com brancas nuvens de algodão onde sobrevoavam jubilosos e contentes pássaros. Numa árvore próxima, maritacas em algazarra faziam festa, com  aquele canto costumeiro que ouvíamos de sua varanda nas árvores vizinhas em minhas constantes visitas.  Supus-me um pouco aliviada. Ainda estou me recompondo. O que importa agora é rezar e pedir por sua alma, para que ela descanse em paz, seguir os seus bons exemplos e recordar os momentos bonitos que tivemos o privilégio de viver com ela que  foi para mim e para todos os da nossa família, uma presença marcante, feliz e repleta de  virtudes  que contagiavam e transmitiam bondade e segurança.
                              Seremos eternamente agradecidos a toda a equipe médica, às dedicadas enfermeiras, aos vizinhos, amigos e familiares, pelas orações, pelas mensagens de carinho e pelo apoio em tão delicado e doloroso momento.
Que Deus Nosso Senhor a tenha em Seu Reino de Glórias e de Luz, “in aeternum.!
“Requiescat in pace”!

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